Compreendendo a ansiedade por uma perspectiva cognitiva
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Melissa Neves Sandrin, Psicóloga
- Introdução: perfil da ansiedade
Algumas características da ansiedade são:
➜Reações físicas: palma das mãos suadas, tensão muscular, coração acelerado (taquicardia), rubor facial, tontura.
➜Estados de humor:
▪ Nervoso
▪ Ansioso
▪ Em pânico
➜Comportamentos:
▪ Evitação de situações onde a ansiedade possa ocorrer
▪ Sair de situações onde a ansiedade começa a ocorrer
▪ Tentar fazer as coisas de forma perfeita ou tentar controlar os acontecimentos para prevenir o perigo
➜Pensamentos:
▪ Superestimação do perigo
▪ Subestimação da capacidade de enfrentamento
▪ Subestimação da ajuda disponível
▪ Preocupações e pensamentos catastróficos
(Fonte: Livro “A Mente Vencendo o Humor” – referências ao final deste texto).
- Ansiedade clínica
As emoções são intrínsecas ao ser humano. Assim, alegria, tristeza, raiva e ansiedade são emoções que fazem parte da vida. Então, quando afirmar que uma emoção não está em seu nível normal?
Em geral, emoções como ansiedade, tristeza e raiva tornam-se estressantes para alguém dependendo da intensidade e freqüência com que ocorrem. Alterações emocionais muito intensas ou muito freqüentes podem representar um sofrimento significativo para a pessoa que as vivencia.
Quando a ansiedade ocorre em níveis muito intensos e/ou com muita freqüência, a pessoa pode, por exemplo, deixar de fazer coisas importantes, evitar situações, desistir de metas pessoais. Tais atitudes podem representar dificuldades a curto e longo prazo.
Aqui, o termo “ansiedade clínica” será usado para se fazer referência a esta ansiedade que interfere prejudicialmente no cotidiano e nas realizações pessoais, constituindo sofrimento emocional significativo para o indivíduo.
- Compreendendo a ansiedade
O principal problema na ansiedade clínica não está na geração da ansiedade em si, mas em pensamentos que estão continuamente avaliando experiências externas (situações) e/ou internas (sentimentos, emoções, reações físicas, pensamentos) como um sinal de perigo ou ameaça.
Pessoas com ansiedade clínica tendem a fazer, automaticamente, dois tipos de avaliações a respeito de situações:
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superestimar o perigo ou ameaça em uma situação/ experiência de vida; e
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subestimar sua capacidade de enfrentamento desta situação.
A percepção de que está sendo ameaçado, está em perigo ou vulnerável de alguma forma prepara o organismo para responder a este perigo ou ameaça. O processamento da situação costuma ser automático. A princípio, a ansiedade normal seria uma reação diante de um perigo “realista” e se dissiparia quando este perigo não está mais presente. No
entanto, a ansiedade clínica é desproporcional ao grau e severidade do possível perigo; Esta ansiedade persiste até mesmo quando o perigo não existe ou não está mais lá. Isto quer dizer que, se a pessoa percebe uma possível ameaça de forma exagerada, desproporcional, alterações emocionais (ansiedade), comportamentais (evitar ou sair de uma situação, por exemplo) e fisiológicas (taquicardia, suor, tremores, tensão muscular) são ativadas como se aquele perigo fosse tão grave quanto ela acredita.
Uma ameaça percebida pode ser física (p.ex. medo de sofrer danos à integridade física), social (p.ex. medo de ser julgado negativamente pelos outros ou de ser rejeitado) ou mental (p.ex. medo de perder o controle ou de ficar “louco”). A pessoa ansiosa tende a acreditar que há enormes chances de adversidades temidas ocorrerem, que os custos ou conseqüências serão altos, e que ela não irá superar ou não saberá lidar com a situação.
o Percebendo situações: o tema da ameaça nos pensamentos Alguns exemplos fictícios e simples de como situações podem ser
percebidas automaticamente como ameaçadoras (pensamentos), levando à ansiedade (emoção) e a comportamentos e reações decorrentes:
Situação: João vê Maria e vai convidá-la para sair.
Pensamento: E se eu levar um não?
Emoção: ansiedade
Comportamento: desiste de convidá-la, mantendo-se à distância.
Reações físicas: tremores nas mãos, taquicardia, rubor facial.
Situação: Angélica faz uma prova e não lembra a resposta de uma questão.
Pensamento: E se eu for reprovada?
Emoção: ansiedade.
Comportamento: começa a ler correndo todas as outras questões, pulando trechos.
Reações físicas: sua, treme. Sintoma cognitivo: desconcentração aumenta.
Desta maneira, pensamentos com conteúdos “catastróficos”, focando o pior que pode ocorrer em uma situação, têm papel central no aparecimento da ansiedade. Esta, por sua vez, interfere na habilidade de
comportar-se dentro do contexto real, comprometendo realizações pessoais importantes para o próprio indivíduo.
- Percebendo a si mesmo na ansiedade
Além de ter um foco na “ameaça” ou “perigo, ocorre a subestimação dos recursos pessoais para enfrentar a situação. Por exemplo, como se lê abaixo, em itálico:
João pensa: Se eu levar um não, nunca mais conseguirei convidar alguém.
Angélica pensa: Se eu for reprovada, nunca conseguirei um bom emprego!
Na ansiedade, em geral, há uma percepção de si mesmo como sujeito a perigos externos ou internos sobre os quais o controle da pessoa está ausente ou é insuficiente para fornecer a ela um senso de segurança. Assim, a pessoa sente-se vulnerável. A autoconfiança da pessoa ansiosa fica diminuída: ela acredita não ter importantes habilidades necessárias para enfrentar ou superar situações de vida adversas (exemplos dados: convidar alguém para sair, levar um não, fazer uma prova ou recuperar-se de uma reprovação). Supondo que João e Angélica percebessem as situações de outras formas, provavelmente teriam outras emoções e comportamentos. Por exemplo:
João pensa: Se eu levar um não, ficarei chateado por um tempinho e passa. Provavelmente, terei outras chances com outras mulheres e poderei ser bem-sucedido em algum momento com alguém que eu goste.
João sente: uma ansiedadezinha “normal” ou calma.
João age: vai até Maria, puxa assunto e arrisca convidá-la para sair.
Angélica pensa: Se eu for reprovada, não vai ser como eu queria, mas poderei prestar esta prova em outra ocasião. Aliás, pensar nisso
agora não vai me ajudar a me concentrar. Melhor seguir adiante e tentar fazer o melhor que puder agora.
Angélica sente: calma.
Angélica age: continua respondendo a prova, focando questão por questão, sem “se atropelar”.
Obviamente, estes são apenas exemplos fictícios. Não têm a pretensão de apontar jeito certo ou jeito errado de pensar. Apenas buscam ilustrar que a maneira como se encara uma situação pode ser mais ou menos embasada em evidências da realidade, da experiência de vida, e pode levar a diferentes emoções e atitudes. Além disso, é importante ressaltar que, ao acreditar totalmente em uma interpretação (pensamento), outras explicações plausíveis são automaticamente descartadas ou ignoradas, o que auxilia na manutenção da alteração do humor.
- Tratamento pela Terapia Cognitiva
Na Terapia Cognitiva, o tratamento tem como principal alvo de intervenção a cognição, sendo que pensamentos automáticos e crenças pessoais relacionados à ansiedade podem ser identificados, questionados e reformulados, contribuindo para a melhora do humor e para novas formas de encarar e enfrentar situações de vida. Paralelamente, usa-se uma abordagem de resolução de problemas que, nos casos de ansiedade, possuem papel importante no enfrentamento pessoal, bem como na mudança da maneira como o indivíduo percebe seu enfrentamento.
- Referências bibliográficas
Este texto foi baseado no seguinte material:
A mente vencendo o humor: mude como você se sente, mudando o modo como você pensa. Autores: Dennis Greenberger e Christine Padesky. Porto Alegre: Editora Artes Médicas Sul Ltda., 1999.
Anxiety disorders and phobias: a cognitive perspective. Autores: Aaron Beck, Gary Emery e Ruth Greenberg. New York: Basic Books, 2005.
Fronteiras da terapia cognitiva. Salkovskis, P.M.(Ed). São Paulo: Casa do Psicólogo, 2004. Capítulo 3: Ansiedade, crenças e comportamento de busca de segurança (por Paul Salkovskis).
Melissa Neves Sandrim
CRP 06/65701
Especialista em Terapia Cognitiva